Close

outubro 9, 2016

O Bibliotecário da presidente: bibliotecário de pessoas

o bibliotecario da presidente

Levei a busca pelo meu ajudante muito a sério, fui ler sobre recrutamento de pessoas, técnicas de seleção, entrevistas e mais um monte de coisas relacionada a recursos humanos. Foi nesses estudo que descobri o Headhunting, mas não me refiro a prática da era medieval de arrancar e preservar cabeças humanas como troféus.

Headhunting é uma forma de recrutamento onde o recrutador garimpa candidatos com habilidades bem específicas para convida-lo a participar de um processo seletivo de uma organização.

Uma parte importante do trabalho do headhunter é pesquisar sobre a pessoa de interesse, trabalho que lembra bastante o de um bibliotecário. Ao invés de livros ou documentos, precisamos achar a pessoa que atende a necessidade de um contratante. Para mim, headhunter nada mais é do que um bibliotecário de pessoas.

A diferença é que um bibliotecário de pessoas precisa ser mais astuto do que um bibliotecário tradicional. Pesquisar pessoas requer tato, habilidades sociais e muita imaginação.

Eu queria recrutar a melhor pessoa possível para fazer uma parceria e surpreender a presidenta com um trabalho diferenciado. Esse era o meu desafio e eu estava disposto a encarar. Isso não era muito fácil pra mim, tive que sair da zona de conforto em diversas ocasiões. Falar com pessoas mal educadas ao telefone, ser chato e insistente pra conseguir uma informação sobre um possível candidato. Essa rotina levou alguns dias de trabalho.

Eu precisava ser agressivo na minha busca. Precisava de uma pessoa leal, com horários flexíveis e, principalmente, uma pessoa que pudesse me ajudar com levantamento e análise de informações, geração de relatórios, interpretação de gráficos, enfim, uma série de habilidades que não seria fácil de achar em uma pessoa só.

A primeira entrevista que eu fiz foi com um rapaz do interior de São Paulo, da cidade de São José dos Campos. Encontrei ele em um site de freelancers. Trocamos algumas mensagens pelo site e marcamos uma entrevista via Skype.

Seu nome era Lucas, ele tinha 20 anos de idade e era autodidata em marketing digital. Havia lido o livro do Timothy Ferriss, Trabalhe 4 horas por semana e tinha pirado na ideia de desenvolver sites na internet que gerassem pra ele uma renda passiva suficiente para que ele não precisasse mais trabalhar em empregos convencionais. Conversamos sobre outros autores da área e sobre a filosofia do nomadismo digital.

Lucas tinha o conhecimento que eu precisava, ele conseguiu demonstrar isso nos sites que ele gerenciava, através de relatórios e ferramentas de business intelligence que ele usava para auxiliá-lo na interpretação das informações. Mas tinha um pequeno problema administrativo que eu precisava contornar caso contratasse ele. Como ele morava em outra cidade, a maior parte do trabalho que ele ia realizar seria feito remotamente e a administração pública ainda é muito retrógrada nesse aspecto.

A segunda pessoa que eu entrevistei foi uma menina, programadora, gênia da informática. Aline tinha apenas 17 anos e já estava na UnB cursando Ciência da Computação. Descobri ela através de um amigo professor. Aline é daquela geração que nasceu praticamente mexendo com tecnologias. Aos 10 anos já tinha feito um programa de computador que calculava a média das notas e quanto ela ia precisar tirar para passar de ano na escola nas próximas provas. Mostrou para os colegas de sala e, quando se deu conta, todos os alunos da escola em que ela estudava estavam usando o programa.

Fiquei muito impressionado com ela. Conversamos pessoalmente e notei que ela tinha a personalidade típica de um programador. Muito tímida e introvertida. Senti que teria problemas com isso. Mas tecnicamente ela era muito boa. Falei sobre a ideia de monitoramento das redes sociais com geração de relatórios e ela fez várias sugestões de abordagens. Com 20 dias de desenvolvimento ela prometeu me entregar o melhor software de monitoramento que eu já vi.

Mais uma vez teria problemas administrativos, uma menor de idade, no segundo semestre do curso, teria que dividi-la com a Universidade, sei que não poderia contar com ela o tempo todo. Ela merecia muito mais do que um salário de estagiário. Estava com medo do Cláudio colocar muitos obstáculos na contratação. De qualquer forma ela era uma pessoa de interesse e eu tentaria trazer ela pra minha equipe se fosse possível.

A última pessoa que entrevistei para o trabalho foi, acredite se quiser, era uma pessoa transgênero. A princípio não notei, mas na entrevista ele me informou. Ricardo tinha nascido mulher, mas desde os 10 anos notou várias transformações no seu corpo e na sua mente. Aos 18 assumiu a nova identidade e aos 30 era um designer de mão cheia. Trabalhava com ilustração, desenvolvimento de websites e produção de conteúdo.

O que mais me chamou atenção no Ricardo foi a sensibilidade. Ao explicar a minha ideia, ele me deu insights de como eu poderia apresentar os relatórios de forma sucinta. Ele afirmou que eu teria muito pouco tempo para apresentar o resultado do meu trabalho para presidenta, portanto, eu teria que ser bem minimalista na minha fala e nos recursos gráficos. Eu tinha que ir direto ao ponto e oferecer soluções para os problemas que eu mesmo iria apontar.

Que dúvida cruel. O ideal para mim aquela altura seria contratar os três, mas não teria coragem de fazer essa solicitação. Cláudio já não tinha gostado muito da ideia de eu ter um ajudante. O motivo era falta de orçamento. Ele havia dito que só tinha conseguido a vaga que eu pedi porque acreditava no meu projeto e que por isso iria fazer um teste. Se desse certo ele manteria essa vaga pra mim. Tudo nesse projeto foi assim, era como pisar em gelo fino.

No final dessa semana de entrevistas eu precisava dar um nome para o Cláudio para mandar a papelada ao departamento de pessoal e formalizar a contratação. Já era sexta-feira e eu não havia decidido quem contratar. Os três candidatos eram muito bons. O headhunter tinha se provado uma ferramenta muito útil pra mim, mas o que no início facilitou o meu trabalho de recrutamento no final dificultou a minha tomada de decisão, pois tinha que optar apenas por um candidato.

No final do expediente Cláudio apareceu na biblioteca e me pediu o nome da pessoa que eu queria contratar. Depois de muito pensar ao longo de todo o dia, em questão de segundos respondi o primeiro nome que me veio a cabeça. Ricardo. Estava decidido, vou com o designer. Cláudio foi embora dizendo que ele poderia começar na segunda-feira, simples assim. E eu pensando que ia ter uma burocracia enorme. Parece que na presidência as coisas andam mais rápidas.

Liguei para o Ricardo para dar a notícia. Ele ficou satisfeito e disse que eu não ia me arrepender. Combinei o horário com ele na segunda-feira e já pedi pra ele ir pensando em como implementar as ideias que tínhamos conversado na entrevista. Sem pestanejar Ricardo disse que levaria um protótipo já na segunda-feira, que ficaria o final de semana inteiro trabalhando nisso. Gostei da sua pro atividade, e fui pra casa certo de que tinha feito uma boa escolha.

Precisava dar uma satisfação para os outros candidatos mas depois de uma semana cansativa só queria ir pra casa descansar. Falaria com Lucas e Aline no final de semana. Não tinha descartado eles ainda. Tinha certeza de que eventualmente poderia pedir um trabalho específico por fora pra eles e estava disposto a pagar do meu próprio bolso se fosse necessário.