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dezembro 1, 2016

O bibliotecário da presidente: de volta ao trabalho

As eleições de 2014 estavam próximas, por isso as reuniões com a presidente diminuíram bastante. Principalmente quando mostrei a prévia do relatório do Ricardo para Dilma e não obtive resposta. Fiquei na dúvida se ela tinha gostado do trabalho, se estava sem tempo pra analisar ou se ela tinha odiado mesmo e só estava esperando as eleições passarem para me demitir.

De qualquer forma fiquei trabalhando em análise de informações em redes sociais junto com o Ricardo. Ele me mostrou algumas ferramentas bem interessantes. Fiquei impressionado com o tanto de tipos de relatórios que podemos fazer com algumas ferramentas.  O Seekr, por exemplo, um software que a gente usou para monitorar o que estava sendo falado sobre a presidenta, em várias redes sociais como o Twitter, Facebook e Instagram. Ferramenta incrível que possibilita buscas dentro das mídias sociais, fazendo com que os resultados apareçam em tempo real.

Outra ferramenta que eu achei bem legal foi a Scup que a gente usou para saber o que o povo estava achando do atual governo, das pesquisas de boca de urna e dos planos do governo da Dilma e de seus adversários.  O Scup se baseia em três necessidades: ouvir, interagir e compreender. Essa ferramenta permite classificar as ocorrências por negativas, neutras e positivas e tem o auxílio de palavras-chave para organizar os itens monitorados.

Lembro-me de ter ficado chocado com a variedade de ferramentas que o Ricardo me mostrou e como em nenhum curso de Biblioteconomia que eu conheço apresenta isso em alguma disciplina. Fiquei com a sensação de que, mesmo se eu não continuasse nesse trabalho, outras portas iam se abrir para mim profissionalmente.

Essa sensação se transformou em realidade quando recebi uma ligação de uma pessoa que se identificou como coordenador da campanha da Dilma. Um cara chamado Luiz Marinho. Ele estava com os meus relatórios em mãos e começou a fazer várias perguntas sobre como eu tinha chegado a alguns números em relação à resposta da população sobre o plano de governo para a possível próxima gestão.

Com Ricardo do meu lado fazendo um monte de sinal e desenhos numa folha de papel eu fui respondendo todos os questionamentos feitos por Luiz, ele me pareceu satisfeito e ao final da ligação me convidou para uma reunião da coordenação de campanha para fazer uma apresentação para toda a equipe. Hesitei um pouco, pois achei que isso poderia ser desvio de função, mas disse sim.

Assim que desliguei o telefone, liguei para o Cláudio para pedir conselho sobre essa situação. Ele disse que isso é normal e que fazia parte das minhas atribuições. Pedi para ele formalizar nossa conversa por correio eletrônico, o que ele fez prontamente, e comecei a montar uma apresentação matadora com o Ricardo para impressionar todo mundo.

Usamos o Prezi para sair um pouco da mesmice do MS Power Point e dar mais dinâmica para apresentação. Uma pena a versão gratuita ser um pouco limitada. Nunca usei a versão paga, mas os recursos que eles vendem parecem ser promissores.  Fiquei satisfeito com o resultado da nossa apresentação. Ricardo foi um grande parceiro nessa época, formamos uma equipe eficiente. Sem ele não conseguiria fazer o trabalho que fizemos e não teria chegado aonde cheguei, mas isso é história para outro capítulo.

Tivemos cerca de uma semana para concluir os trabalhos dos relatórios e bolar o roteiro da apresentação. Terminamos tudo em cinco dias e quis fazer a apresentação para algumas pessoas antes de fazer para o pessoal da coordenação de campanha. Uma boa prática é sempre testar suas apresentações com amigos antes de apresentar pra valer. Fiquei muito mais seguro e tive a oportunidade de melhorar alguns pontos.

Convidei a Fernanda e o Cláudio e em cerca de 18 minutos conclui a apresentação e abri para críticas. Fernanda e Cláudio fizeram bastantes elogios e apontaram algumas coisas, pediram pra eu retirar alguns relatórios que consideraram não serem tão importantes assim e com isso minha apresentação ficou mais enxuta e direta ao ponto.

Agradeci a paciência dos dois, Cláudio se retirou rapidamente e fiquei conversando com a Fernanda, ela estava trabalhando muito ultimamente por conta das viagens com a presidenta pelo Brasil e nem tivemos chance de conversar sobre como estávamos, mesmo porque eu também estava ralando muito, mas aproveitamos aquele momento para falar da vida e marcar um almoço quando tudo aquilo acabasse.

No dia da apresentação estava extremamente nervoso, mas não tinha como eu desistir, respirei fundo e fui para o Palácio da Alvorada. A apresentação ia acontecer na biblioteca. Cheguei antes de todo mundo, montei a parafernália, repassei a apresentação na tela e na minha cabeça.

Em questão de minutos após meu ensaio, Luiz Marinho e sua equipe entraram na biblioteca, eram cinco pessoas, entre assessores e coordenadores de campanha. Quando comecei a introduzir o assunto a presidenta entrou na sala, pediu desculpas pelo atraso e diz que gostaria de ver minha apresentação. Gelei!  Mas comecei falando de uma forma geral o que a população estava achando do plano de governo de Dilma.

Abordei a reação das pessoas aos debates e às propagandas políticas. Dei dicas de que assuntos que eles poderiam abordar nas próximas propagandas baseada em análises de palavras-chaves e mostrei as últimas pesquisas de boca de urna e o que fazer para a Dilma manter a diferença de votos que dariam a vitória pra ela nas eleições. A época ela estava cerca de cinco pontos percentuais na frente do principal concorrente, Aécio Neves.

Quando terminei, o pessoal da coordenação já estava conversando freneticamente com a presidenta. Ignoraram o final da minha apresentação, onde eu mostrava algumas tendências que apontavam um acirramento da disputa no segundo turno das eleições. Fiquei chateado, mas fui até o fim mesmo assim. Abri para perguntas e não obtive nenhuma. Dilma me agradeceu e pediu que eu me retirasse da sala.

Fiquei abalado. Acho que eu esperava mais reconhecimento, afinal eu acreditava no trabalho da minha equipe. Tentei relativizar o fato dizendo pra mim mesmo que essas pessoas são ocupadas de mais para dar algum tipo de retorno, devem ter várias reuniões por dia e por isso são um pouco insensíveis. Não adiantou. Acabei indo pra um boteco com o Ricardo contar o que tinha acontecido.

Certo de que seria dispensado após minha apresentação, Ricardo e eu tomamos todas no bar para afogar as mágoas. Fizemos vários planos para o futuro que estava por vir. Resolvemos criar uma empresa de consultoria em informação. Não era papo de bêbado, nós realmente acreditávamos que a nossa ideia poderia dar certo. Só dependia da gente.

No dia seguinte, fui trabalhar com uma tremenda ressaca. Achando que não tinha mais nada a perder. Cheguei ao trabalho um pouco atrasado, na verdade nem queria ter ido, pensei em ligar inventando uma virose. Mas queria saber logo qual seria o meu destino. Quando cheguei à biblioteca do palácio, Cláudio já estava me esperando e estava com uma cara nada boa. Pediu para eu sentar e disse, para minha surpresa, que eu estava liberado dos trabalhos na Presidência e que agora faria parte da Coordenação de Campanha da Dilma. Com o detalhe de que eu teria um orçamento próprio para continuar o meu trabalho.