Como construir um espaço maker ou makerspace

Locais para criação precisam atender a comunidade sem a preocupação de ter equipamentos caros e servir só para construir robôs

por Sylvia Martinez, do EdSurge

O Movimento Maker invadiu a mente das escolas nos últimos anos. Para algumas, ele serve como sinal de alerta de que jovens que fazem muitas provas e que convivem com um calendário pesado não se tornarão criativos e apaixonados pela leitura como todos esperamos. Para outras, trata-se de uma reconexão com nossos impulsos coletivos e mais profundos para criar, inventar e transformar o mundo. Espaços maker, design thinking e outros modelos servem para dar vida a essas ideias em salas de aula, bibliotecas, museus e centros comunitários. Mas essas inovações são acessíveis a todos, a todas as crianças?

Leah Buechley é uma ex-professora do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e inventora de várias tecnologias maker que aliam modernas tecnologias à tradição manual. Ela defende uma guinada para além de robôs e competições para que sejam incluídas novas ferramentas, tradições e indivíduos. O movimento Maker não deve ter somente pessoas brancas e ricas e os brinquedos que elas podem comprar e construir. Nas escolas, esse movimento parece óbvio. Quem não aceitaria que todas as crianças se beneficiem? Entretanto, existe uma crença de que é necessário ter equipamentos caros e grandes projetos de modelagem para fazer parte do movimento maker de verdade. Nada poderia ser mais distante da verdade.

Existem inúmeras organizações trabalhando para trazer o empoderamento de criação a uma maior parcela de pessoas, não apenas nos EUA, mas ao redor do mundo. O FabLearn Fellows, projeto do Stanford Transformative Learning Technologies Lab, é formado por 18 educadores que trabalham em diferentes escolas, entidades comunitárias e museus pelo mundo. Seus blogs e posts oferecem muitos “comos” e “porquês” de projetos bem-sucedidos em inclusão e empoderamento.

Uma das bolsistas é Susan Klimczak, organizadora do programa Learn 2 Teach, Teach 2 Learn no South End Technology Center @ Tent City, uma iniciativa que conta com parceria do MIT. O objetivo é criar espaços criativos e seguros para estudantes de ensino médio e universitários usarem processos de design para criarem um futuro melhor e mais justo. Esses jovens não apenas participam, como aprendem a ensinar e a compartilhar suas novas habilidades com os outros, criando comunidade e cultura autossustentáveis. Susan compartilha suas estratégias para participação da comunidade e empoderamento de jovens e serve de influência a muitos outros espaços que focam na inclusão: empoderamento não é algo que você FAZ para as pessoas, é algo que acontece quando as pessoas fazem coisas poderosas que interessam a elas.

Um outro bolsista do FabLearn, Roy Ombatti, é coordenador do FabLab de Nairobi (capital do Quênia). Roy participa de um projeto para combater a infestação de bicho-de-pé em comunidades pobres. Elas contaminam pessoas que vivem em condições de saneamento básico precário e andam com pés descalços. O projeto, chamado “Happy Feet”, ensina jovens e adultos a fazerem seus próprios calçados por meio de impressão 3D, construindo modelos que cabem em qualquer pé, saudável ou não, para prevenir novos surtos. Como Roy diz, “é claro que a solução para o bicho-de-pé não está apensa nos calçados. O cerne do problema é a pobreza e algo precisa ser feito para combater isso diretamente. Espero fazer isso por meio da educação maker. Com maior apoio e conscientização, eu vejo os centros de fabricação de calçados servindo como pequenos FabLabs onde os jovens aprendem habilidades e apresentados à criação. Com essas habilidades, jovens certamente terão uma melhor opotunidade de vida e não se verão apenas como parte da solução, mas empoderados a fazer mais… muito, muito mais”. Roy também está trabalhando para baratear o custo da impressão 3D ao usar material reciclado como matéria-prima para o filamento de plástico.

Os dias de espera por uma doação ou por uma empresa que faça o que você precisa estão acabados. As pessoas estão usando a tecnologia maker para construir suas próprias vidas e fazer as transformações que importam para si e para suas comunidades.

Nettrice Gaskins, uma artista e educador que é diretora da STEAM Education Lab na Boston Arts Academy, escreve e dá palestras sobre essa mudança sutil que faz toda a diferença. Em Recontextualizing the Makerspace: Culturally Responsive Education, ela discute uma “redefinição dos processos tecnológicos para que incluam o engajamento de grupos subrrepresentados na cultura faça-você-mesmo/hacker/maker” Ao criarem espaços e eventos que sejam culturalmente receptivos e culturamente localizados, eles servem como catalizadores e agentes de mudanças dentro de uma comunidade, em lugar de se tornarem objeto de mudanças por outros.

A ideia de inclusão não é importante só para organizações comunitárias ou escolas de baixo nivel socioeconômico. Todo espaço maker deve estar ciente de sua capacidade para servir a todos: crianças e adultos, todos os gêneros, com todo o tipo de experiência, e aqueles que são interessados em artes, engenharia, ou ambos. Mesmo nos espaços maker com melhores recursos deve haver cuidado constante sobre as suposições feitas por quem queira utilizá-los. 

Para criar experiências inclusivas em escolas, educadores devem levar em consideração os seguintes fatores:

– Empoderar estudantes não apenas para serem objetos passivos das aulas, mas para inclui-los como aliados e defensores para fazer coisas que sejam importantes para eles.

– Um espaço culturalmente receptivo, localizado e relevante não significa pedir para estudantes escreverem letras de hip hop sobre método científico. Mas da mesma forma não significa ignorar o hip hop. Analisar as práticas culturais por uma perspectiva maker pode abrir portas e derrubar as barreiras entre professores e estudantes.

– Sensibilidade. Pesquisas mostram que meninas reagem a um ambiente que reflete uma cultura hacker estereotipada negando que tenham interesse em ciências e em engenharias. Se você não tiver certeza sobre a característica da sua classe ou espaço maker, pergunte a algumas crianças

– Diminua a competição. Competições abertas ou mais sutis, como aquelas causadas pela falta de material e ferramentas apropriados, podem mitigar a participação das meninas. Isso pode também significar uma barreira para os iniciantes e os estudantes que não se consideram “técnicos”. A competição aumenta os riscos a um nível que pode ser muito alto para eles tentarem algo que possam realmente gostar.

– Não privilegie um tipo de construção em detrimento de outro. Robôs são legais, mas as mesmas tecnologias de microcontroladores, sensores, motores e luzes podem fazer roupas inteligentes (uma invenção útil para uma tia idosa), ou melhor ainda, algo que ninguém tenha pensado antes. Ofereça incentivos, múltiplos acessos e elogios a todos os tipos de ideias.

Existem muitos, muitos exemplos de espaços maker ligados às comunidades e às escolas, que trabalham para empoderar a todos, não só aqueles que querem construir robôs. Espaços maker devem ser lugares para empoderamento de pessoas, todas elas, para que experimentem a possibilidade de dar sentido ao mundo e torná-lo um lugar melhor para suas vidas.

Comentário de Gabriela Agustini

Outro ponto muito importante para fazer um espaço maker ser convidativo para pessoas de qualquer classe econômica/social e em contextos como o nosso é a adoção de tecnologias abertas. Nesse sentido, trabalhar com conserto, reuso e reutilização é uma ótima forma de trazer os conceitos makers de maneira que façam sentido para o dia-a-dia das pessoas em nosso país. Oo Olabi Makerspace no Rio, tem tentado cada vez mais trabalhar com esse olhar para ampliar a diversidade e atender um público mais amplo. É difícil empoderar pessoas com tecnologias fechadas e com preços pouco acessíveis, por isso trazer a lógica da abertura é importante.

Fonte

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